terça-feira, 27 de outubro de 2009

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Design é uma conversa

Tem gente que acha que ele veio para embelezar; tem quem acha que veio para enfeitar. Tem até aqueles – por que não dizer? – que acham que ele veio para atrapalhar. Na outra ponta, tem os que acreditam que o design é uma forma de arte e veio para ser admirado. São poucos, bem poucos, que percebem que sua verdadeira função é conversar.
Conversar? Sem dúvida. Por mais que seja às vezes confundido com uma forma de “arte”, o design é, na verdade, comunicação. O uso de cor, por exemplo, foi feito para aumentar o contraste entre os elementos e, dessa forma, garantir uma hierarquia entre eles. Onde há hierarquia, há uma ordem de visualização em que cada coisa fica em seu lugar. Da mesma forma que títulos, subtítulos e parágrafos em um texto, cores e formas existem em uma composição visual para serem “lidas”. E é exatamente porque essa acontece sempre, e na maior parte das vezes nem é percebida, que ela é tão importante.
A percepção visual tem outra característica bem interessante: ela é instantânea. Ao contrário da comunicação verbal, falada ou escrita, que demanda um tempo, algum tempo, para ser percebida, o design causa reações imediatas. Ninguém gosta de um texto sem lê-lo e poucos precisam de mais do que alguns segundos para achar uma foto, um cartaz, um website, feio ou bonito. E no entanto, quanto mais se olha para uma imagem, mais se percebe. Se ela for suficientemente rica, você pode passar uns dez minutos só olhando para ela, descobrindo novos detalhes, sem notar o tempo passar. Experimente pegar seu texto predileto e ler a mesma página mais do que duas ou três vezes e você perceberá como ele se torna rapidamente chato. Depois da primeira leitura há pouco, muito pouco a se retirar dele.
A linguagem verbal e visual são tão diferentes entre si que o próprio cérebro usa partes diferentes para processá-las. E, no entanto, a maioria das escolas secundárias ensina que desenhos são bobagens e palavras e números, importantes. É uma bobagem tão grande quanto acreditar que só a perna direita é importante. Por essa falha no sistema de ensino ocidental, muito adulto inteligente tem a percepção visual atrofiada e desenha feito uma criança.
Ou pior.
Por isso o design é tão importante. A linguagem visual tem a velocidade e performance adequada para um mundo cada vez mais acelerado, em que as mensagens precisam ser instantâneas. Por ser uma espécie de intérprete do visual, a função do designer é transformar conceitos em formas. Estas devem ser interessantes o suficiente para atraírem a atenção de quem as vê, estimular nele um diálogo em que essas imagens são novamente “traduzidas” de volta em conceitos e idéias – e, finalmente, assimiladas.
Um bom profissional sabe que não adianta nada fazer uma peça que esteja na última moda em Londres se o consumidor não for capaz de entendê-la. Ele sabe que um grid bem estruturado, que tenha formas alinhadas com precisão não é uma frescura, mas uma forma eficientes de comunicar com clareza a estrutura da página. E essa estrutura deve sustentar a própria estrutura do discurso. Quanto mais proporcional, harmoniosa e equilibrada ela for, melhor será recebida. Mesmo que seu leitor seja analfabeto em design, perceberá automaticamente que as coisas ali estão arrumadas, portanto devem ser fáceis de usar. As grandes marcas sabem muito bem disso – e usam o design em tudo, até (e principalmente) nos materiais que têm pouco ou nenhum glamour, como os manuais de instruções.
Um bom profissional de artes visuais, seja ele pintor, fotógrafo ou designer, costuma planejar uma rota clara para o olhar de quem vê suas peças. Sem ser percebido, ele pega o espectador pela mão e o guia através de sua composição, sem esforço. Como um grande DJ, que alterna timbres e sons a noite toda sem que a pista perceba a transição. E como o DJ, por mais que domine sua arte, ele precisa conhecer muito bem o público e seus gostos – e responder a eles.
Como eu disse no começo desse texto, é uma conversa. Não é?
maio de 2008 – revista Webdesign nº53

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